"A grande religião ecumênica"


"Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração." (Mateus 6:21)

Depois de alguns anos de expectativas, controvérsias e gastos formidáveis, o Brasil testemunha o início da Copa. O futebol é considerado o circo do mundo. Nenhum outro esporte é capaz de provocar tanta paixão, alegria ou tristeza. Para milhões, ele dá sentido à vida, mas acaba custando a vida de muitos. É o assunto dos fins de semana e provoca, nas segundas-feiras, acaloradas discussões nas fábricas, bares e escritórios, entre outros lugares. Os estádios assemelham-se a grandes templos em que se manifesta uma devoção quase religiosa. Pode-se concluir que o futebol é a "fé professada por milhões".

Como Rubem Alves observa, o futebol é "a grande religião ecumênica", acabando com diferenças e nivelando todos como torcedores. As paixões geradas pelo mundo da bola deveriam ser objeto de análise psiquiátrica, tal o caráter misterioso e complexo de suas manifestações. Conflitos de torcidas não são raridade, fazendo aflorar os mais fortes instintos que moram nos homens.

Conta-se que um palmeirense fanático, que odiava corintianos, já velho, em agonia, esperava apenas o apito final, terminando o jogo para ele. Chama o filho e, com voz tremula, lhe diz: "Filho, estou morrendo. Quero que você faça a minha última vontade. Vá até a torcida organizada do Corinthians, leve minha fotografia e inscreva-me como sócio." O filho achou que o velho já começava a ficar mentalmente avariado. Tentou dissuadi-lo, mas o pai foi irredutível. Assim, decidiu fazer sua vontade. Foi e voltou com a carteirinha de sócio. O velho, vendo o próprio rosto na carteira, sorriu satisfeito e disse: "Ah, a suprema alegria de ver um corintiano morrer..." A piada de mau gosto aqui ilustra uma conduta que, no mínimo, nos intriga.

Especialistas em crescimento da igreja falam do desinteresse e tédio das audiências religiosas em países secularizados. Contudo, tal conclusão é questionável. Observei, numa das Copas, como os "frios" alemães pulavam em frenesi infantil com a vitória de seu time. Não seria isso a evidência de interesse mal orientado? Quem nos dera poder transferir um pouco do entusiasmo do futebol para as coisas sérias da vida! Muitas causas legítimas seriam beneficiadas pela paixão que anima os torcedores. Já pensou se tal fervor fosse aplicado na real eliminação da pobreza, no atendimento às crianças desamparadas, em educação, saúde, segurança e punição de corruptos? Oriente sua empolgação às causas que merecem toda a sua energia.

(Amin A. Rodor, Encontros com Deus)