A Arqueologia e Jesus


Em termos arqueológicos, podemos mencionar pelo menos quatro achados relacionados diretamente  com o contexto histórico de Jesus de Nazaré:

O Ossuário de Caifás

Em novembro de 1990, profissionais da construção civil trabalhando na edificação de um parque aquático na Peace Forest, sul da cidade velha de Jerusalém, encontraram uma tumba selada desde a guerra romana de 70 d.C.

Os arqueólogos da universidade hebrica correram ao local e encontraram 12 ossuários (caixas para ossos feitas de calcário). Dentro delas estavam os restos mortais de pelo menos 63 indivíduos, todos possivelmente aparentados entre si, pois se tratava de um jazigo familiar.

Um dos ossuários, o mais ornamentado deles, surpreendeu a todos. Conforme o costume da época, alguns desses caixões traziam na tampa ou do lado o nome daquele que estava ali sepultado. A inscrição aramaica estava suficientemente bem preservada para ser lida pelos especialistas. Ela dizia: Yehoseph bar Kapha ou “José filho de (ou da família de) Caifás.” Esse era exatamente o nome completo do sumo sacerdote que prendeu Jesus. A Bíblia limita-se a chamá-lo de Caifás, mas o restante de seu nome está bem documentado nos escritos de Josefo, que assim se refere à sua pessoa. [1]

No interior do ossuário existiam os restos de um homem de aproximadamente 60 anos, o que aumentam as chances de ser o mesmo Caifás descrito no Novo Testamento. Esse memorável achado provê, pela primeira vez, os restos físicos de alguém mencionado nas Escrituras.

Barco da Galiléia [2]

No inverno de 1986, após vários anos de seca, o nível da água do Mar da Galiléia baixara em vários metros e a linha costeira havia recuado consideravelmente. Dois jovens estavam caminhando ao longo da praia ao sul do kibutz de Ginnosar, situado na margem ocidental do lago, e perceberam os contornos de uma estrutura de madeira enterrada na lama. Novamente os especialistas foram chamados para examinar a descoberta e concluíram tratar-se dos restos de um antigo barco. Decidiu-se, então, escavar o local imediatamente, antes que o nível da água subisse.

Foi necessário o uso de técnicas modernas e sofisticadas para erguer e transportar o barco. Em primeiro lugar, foi construído  um maciço dique em volta do local, a fim de impedir que o lago o inundasse, também usaram bombas para afastar as águas em baixo dele. Ao mesmo tempo, porém, era preciso manter a madeira molhada enquanto a lama era removida do casco, que foi então reforçado com fibra de vidro e preenchido com poliuretano – uma substância sintética que também contribuiu para a preservação da estrutura.

Depois de cavarem algumas valetas e reforçarem os lados do barco, os técnicos finalmente terminaram o empacotamento da frágil estrutura. Era então o momento de bombear água para dentro das valetas, permitindo que o barco flutuasse novamente depois de quase dois mil anos enterrado na lama do lago. Várias pessoas foram ver a cena, que foi digna de aplausos e até lágrimas por parte de alguns membros da equipe.

O trabalho, porém, não havia terminado. Uma vez que o barco foi seguramente retirado das águas, os técnicos o levaram para um tanque especialmente construído no kibutz onde puderam, com muita calma e paciência, retirar o invólucro de poliuretano e mergulhá-lo de novo numa água com produtos químicos que ajudariam a preservar a madeira, até que fosse revestida de cera sintética e finalmente exposta à visitação pública no próprio museu do kibutz, chamado Yigal Allon Center.
Pelas técnicas de construção e os dois vasos de cerâmica encontrados nas proximidades, os arqueólogos consideram que o barco era do período romano. Testes de carbono-14 confirmaram que o barco foi construído entre 100 a.C. e 70 d.C.

Ao todo o barco mede 8,2m de comprimento, 2,3m de largura e 1,2m de profundidade. Ele foi construído segundo o conhecido modelo de “casca primeiro”, com encaixes de tábuas de cedro e armações de carvalho. Boa parte de sua madeira era de “segunda mão”, tendo sido removida de barcos mais velhos e obsoletos. Outros fragmentos de madeira foram descobertos nas proximidades, o que prova que o local onde o barco foi encontrado era um estaleiro.
A embarcação tinha tamanho suficiente para transportar 15 passageiros, inclusive uma tripulação de cinco pessoas. Embora tenha sido aparentemente usado para a pesca, talvez tenha servido também para o transporte de pessoas e mercadorias.

A importância desse achado está no fato de que as poucas informações que possuíamos a respeito de barcos no Mar da Galiléia durante a época dos romanos eram provenientes de fontes escritas como Flávio Josefo e o Novo Testamento, ou de mosaicos com desenhos de barcos. A descoberta desse barco milenar no Mar da Galiléia despertou, portanto, a atenção mundial. O curioso é que alguns minimalistas chegavam a duvidar da realidade de alguns episódios em que Cristo era visto no barco com seus discípulos. Afinal, supunham ser inconcebível que houvesse naquele tempo algum tipo de barco pesqueiro (evidentemente de pequeno porte) que comportasse 13 pessoas de uma só vez (Jesus e os doze apóstolos). Bem, embora a Bíblia não afirme “quantos” discípulos estavam com Jesus nesses episódios, está claro, por esse achado da Galiléia, que os barcos de pesca tinham condições de levar Jesus, os doze e ainda sobrava lugar para alguns que quisessem uma “carona”. Os críticos, é claro não fizeram mais esse tipo de observação.

O ossuário de Tiago

Esse é o achado que tem despertado grande polêmica entre os especialistas em paleografia e arqueologia. Uns defendem sua autenticidade, enquanto outros a rejeitam. Caso seja verdadeiro, esse achado contém a mais antiga menção a Jesus fora das páginas da Bíblia.

Conforme o que já foi dito, essas urnas de pedra costumavam trazer a inscrição tumular que identificava os restos mortais daquele que estava ali sepultado. No caso específico desse ossuário, temos os seguintes dizeres grafados em aramaico – uma língua próxima ao hebraico e largamente falada nos tempos de Cristo: “Tiago, filho de José, irmão de Jesus”.

Quem primeiro anunciou essa descoberta foi o paleógrafo André Lamaire, que a publicou num extenso artigo da Biblical Archaeology Review. [3] Ele chamou a atenção para o fato de que a expressão “Tiago, filho de José” poderia não indicar muita coisa, pois era a fórmula comum daqueles dias (“fulano, filho de sicrano”). Contudo, o complemento “irmão de Jesus” seria algo completamente inédito, pois não se colocava o nome de outro parente além do próprio pai. A menos, raciocinou Lamaire, que esse parente fosse famoso o bastante para merecer tal destaque.

Daí o que se seguiu foi um jogo de probabilidades combinadas. Qual a chance matemática de haver dois Tiagos na Jerusalém do 1º século que teriam um pai chamado José e um irmão famoso chamado Jesus? Praticamente nenhuma. Logo, cogitou-se da forte possibilidade de ser esse Tiago o mesmo mencionado em Mateus 13:55 e Marcos 6:3. Ou seja, o irmão do Salvador que se tornou um dos primeiros líderes da igreja cristã após a ressurreição de Cristo.

A favor dessa identificação, temos o fato de que Josefo também o menciona em sua obra historiógrafa acerca dos judeus. Ele cita o seu apedrejamento, que teria ocorrido em algum período entre a morte de Festo e a chegada de Albino, seu sucessor (62 d.C.): “festo estava agora morto e Albino estava a caminho. Então ele reuniu o sinédrio dos juízes e trouxe diante deles o irmão de Jesus, que era chamado Cristo, cujo nome era Tiago, e também alguns outros. Então os acusaram de transgressores da lei e os sentenciaram a serem apedrejados.”[4]

Hoje, a questão está dividida nas seguintes teorias: Para uns, tudo não passa de uma grosseira falsificação feita por algum comerciante de antiguidades – afinal, o caixão não foi encontrado num sítio arqueológico, mas entre as peças de um colecionador. Os especialistas também se contradizem. Uns creem na autenticidade do ossuário, mas negam a inscrição, que a seu ver teria sido produzida mais tarde (para uns no 3º ou 4º século d.C., para outros no século 20). E outros ainda pensam que a primeira parte (“Tiago, filho de José”) seria verdadeira, enquanto a segunda (“irmão de Jesus”) seria falsa.

Seja como for, talvez estudos futuros possam elucidar melhor a questão ou deixá-la ainda em aberto, uma vez que questões políticas e judiciais também fizeram parte do episódio. Por outro lado, ainda que não se possa afirmar, sem qualquer dúvida, a autenticidade desse artefato, já possuímos evidências mais que suficientes para comprovar a autenticidade de alguns relatos bíblicos. O que vier será lucro, e, se nada mais encontrado, também não estaremos em prejuízo.

Pilatos

Além do palácio em Jerusalém, Pilatos possuía outra residência oficial, localizada em Cesaréia Marítima. Era uma espécie de Palácio de Verão onde o procurador se refazia nalguns prolongados descansos. Cesaréia Marítima foi por muito tempo o maior porto romano do leste do Mediterrâneo. Dali partiam as grandes navegações em direção a Roma. Paulo embarcou várias vezes nesse local, inclusive na sua última viagem, quando foi finalmente levado preso para comparecer perante o tribunal de César.

Em 1961, arqueólogos italianos que escavavam o teatro romano da cidade localizaram uma placa de pedra que estava sendo disposta no que os arqueólogos chamam de “uso secundário”, isto é, seu posto original fora demolido já no passado e os escombros usados posteriormente como alicerces de um novo edifício.

Assim, alguém de “vista mais atenta” percebeu que entre as pedras reutilizadas na reconstrução do anfiteatro havia uma disposta entre os pisos de uma escadaria que parecia conter uma inscrição em latim. Removida, a inscrição pôde ser decifrada. Ela dizia: “Pôncio Pilatos, Prefeito da Judéia”. Ao que tudo indica, Pilatos havia mandado construir em Cesaréia um Tiberium, isto é, uma estrutura em homenagem ao imperador e, portanto, colocou ali o seu nome como executor da obra. Mais um personagem bíblico que tem sua existência confirmada na história!

[1] Antiguidades 18. 2. 2; 4. 3.
[2] Parte da descrição do achado segue o texto publicado em <http://www.mfa.gov.il>. Acesso em 29 de agosto de 2006.
[3] André Lemaire, "Earliest Archeological Evidence of Jesus Found in Jerusalem" Biblical Archaelogy Review 28 (2002), p.25-33, 70.
[4] Antiuidades 20. 9.1.

(Rodrigo Silva, Escavando a Verdade, p. 160-164, CPB)