Quando o sexo deixa de ser belo


Uma adolescente seduz um homem mais velho e casado; uma repórter pergunta a um pedestre – sem constrangimento – se o tamanho, no caso do pênis, é documento; uma personagem, só de biquíni, dança sensualmente para excitar os rapazes. Não. Não se trata de um canal erótico. Diariamente, é possível ver e ouvir sobre sexo – sem qualquer restrição quanto à abordagem ou ao horário – em todo canal de TV ou meio de comunicação. A sexualidade há muito, deixou de ser um assunto tratado a sete chaves. Muitas vezes, as cenas picantes estão no ar na hora do almoço.

Sexualidade e Ibope
Nos últimos anos, a sexualidade ganhou a mídia e deu ibope, garantindo um espaço cada vez maior. Médicos, sexólogos, terapeutas, psicólogos e psicanalistas vêem a questão com ressalvas. A informação é o caminho da aprendizagem. O detalhe que observamos é que faltam critérios para sua difusão. Poucos programas divulgam informações realmente científicas, alerta a terapeuta sexual Mary de Sá. A terapeuta acredita que a possibilidade de discutir o assunto na mídia é um bom sinal, que enterrou a repressão com que o tema era tratado anteriormente. Mas falta bom senso, já que o sexo está sendo cada vez mais banalizado. A mídia tem sido um estímulo para que crianças e adolescentes cheguem ao sexo sem estarem preparados. Para os adolescentes, faltam referências, lembra a terapeuta. Nas novelas, uma das grandes fontes de entretenimento dos brasileiros, as cenas são baseadas na realidade, mas com desfechos bem diferentes dos vividos todos os dias pelas pessoas comuns. A gravidez precoce e a prostituição parecem bem mais suaves e menos problemáticas. O corpo é mostrado como uma forma de ganho. Sou favorável às discussões apresentadas pela TV, mas acho que o conteúdo e a forma como elas são colocadas são assustadores. Poucos programas têm uma abordagem educativa do assunto, afirma Mary de Sá. Uma das esperanças da terapeuta é que o passar dos anos aperfeiçoe os modos de abordar a sexualidade.

Opinião Pública
A menina na novela transa com o namorado e logo aparece grávida. O fato de estar apaixonada é mais importante do que todos os outros fatores. Como a TV tem um papel importante na formação da opinião pública, esse episódio deveria ser usado como uma forma de reforçar a importância da camisinha e da prevenção da AIDS e da gravidez. Entretanto, os critérios usados para tratar o assunto são contraditórios e trazem confusão. Quem é virgem, por exemplo, entra em um conflito ao assistir cada capítulo, lembra.

O Bom Senso foi Esquecido
A psicóloga e psicanalista Sônia Cury acredita que a sexualidade está sendo tratada na mídia de uma forma vulgar. A questão não está apenas nas novelas, filmes e revistas, chegou também aos programas de entrevista. Até certo ponto, a mídia contribuiu para o assunto ser tratado sem repressão. O detalhe é que os programas passam a qualquer hora. As crianças vêem e não entendem, critica a psicanalista. O resultado deste contato precoce com o assunto traz conseqüências. Não é incomum que os pais cheguem aos consultórios com muitas dúvidas. A criança quer dar um beijo de língua na boca e pede isso à avó. Os pais ficam sem saber como resolver a questão, exemplifica. Como a criança fantasia muito, o sexo pode ser encarado de forma desvirtuada. Não existe preocupação em informar. O conteúdo apresentado na mídia é meramente apelativo, lembra. As personagens eróticas dos programas dirigidos aos jovens chamam atenção para outro tipo de sexualidade: a que não valoriza a pessoa integralmente, mas apenas partes do seu corpo – seios e nádegas é que contam. Para os adolescentes, o estímulo da mídia não gera apenas vontades, mas leva às ações. A cada dia, os jovens transam mais cedo, sem atentar para os riscos de doenças e da gravidez. A censura não resolve, mas é necessário ter mais bom senso, sugere Cury.